
Foto de Giuliano Bueno
Quando um espetáculo infantil não consegue agradar às crianças, dificilmente agrada ao público adulto, quando conquista as crianças, nem sempre atrai a atenção dos adultos, e quando cativa a ambos, é porque há ali um trabalho dedicado e cuidadoso com o conjunto de todos os elementos que compõem uma montagem cênica.
Junho: uma aventura imaginária (apresentado na tarde do último domingo no Teatro Carlos Carvalho dentro da programação do 3º Festival Estadual de Teatro do Rio Grande do Sul – FESTE), do Coletivo Nômade, de Gravataí (RS), é dessas encenações produzidas para encantar públicos de todas as idades. Thiago Silva, que assina o texto e a direção, entrega ao espectador um espetáculo que desde a primeira cena nos convida a embarcar na história do menino Junho (Jardel Rocha) e da família Frank. Aventura, fantasia, curiosidade e descoberta estão presentes do início ao fim, prendendo a atenção do público infantil, que constantemente reage aos acontecimentos e com eles interage, respondendo aos desdobramentos da cena.
Com o objetivo de protegê-lo do mundo exterior e de uma possível maldição, Junho Frank é um menino que vive enclausurado no castelo de sua família. Sob os extremos cuidados da mãe, Judith Frank (Alessandra Bier), e da tia, Morgana Frank (Jennifer Ribeiro), o garoto dedica seus dias à leitura de livros, e sua curiosidade com o mundo faz com que ele apenas possa imaginar as cores e as texturas da natureza e da vida existentes para além dos muros que o protegem.
Dentre tantos acertos, um dos méritos da montagem é o incentivo à leitura. Junho adora ler, sonha em poder viajar e “visitar bibliotecas incríveis e cheias de mistérios”. Com a entrada do seu tio Cosme (Roger Santos) em cena, que retorna de uma viagem, Junho vive grandes aventuras. Contra a vontade de Judith e Morgana, Cosme dá de presente ao sobrinho um livro misterioso que conta a história da família Frank ao longo dos séculos. Mas, o que esconde o livro da família Frank? Cheio de enigmas, é na leitura deste livro que Junho encontra suas próprias origens, descobrindo em suas páginas a história da maldição da família.
As aventuras se intensificam quando Jazz (Ana De David) e Maya (Hayline Vitória) entram no castelo da família Frank através de uma passagem secreta. Com as novas amigas, Junho descobre o mundo para além das fronteiras do castelo. Viajando no tempo, ele encontra sua mãe num passado distante, quando ela tinha a idade que ele tem no presente, e o clima de suspense toma conta de todos quando Jazz, Maya, Junho e Judith são capturados por Antenor (Roger Santos) e Teobaldo (Leonardo Stefanello). Aliás, se existe um equilíbrio entre a atuação de todos, destaco o trabalho de Roger Santos, que certamente ainda nos presenteará com atuações que lhe renderão muitos convites e críticas positivas. E aqui é importante dizer que o elenco é formado por excelentes atores e atrizes que, ao que tudo indica, já possuem uma trajetória e estão acostumados com os palcos.
Mesmo que seja uma peça infantil, há algumas mensagens endereçadas e entendidas exclusivamente pelo público adulto. Com bom humor, incluem críticas ao momento histórico atual de nosso país. Se a história de Junho nos mostra, entre outras coisas, que os livros nos ajudam a entender o passado para, se necessário, mudarmos o futuro, Antenor e Teobaldo também estão ali para nos mostrar que os livros são sempre uma ameaça aos que tem algo a temer.
Se o texto é bom e as atuações sempre imprescindíveis para o sucesso de qualquer montagem, não restam dúvidas de que o cuidado e o profissionalismo dispensados ao figurino (de Jardel Rocha), à maquiagem e à caracterização (de Jardel Rocha e Jennifer Ribeiro), à trilha sonora (de Régis Moewius e Handyer Borba), à iluminação (de Ariel Medeiros), à cenografia e aos acessórios (de Roger Santos) também contribuem para que Junho: uma aventura imaginária arrebata os espectadores, ganhando-os do início ao fim do espetáculo.
Essa crítica foi escrita por Cristiano Goldschmidt a convite da organização do 3º Festival Estadual de Teatro do Rio Grande do Sul (FESTE), que aconteceu entre os dias 06 e 09 de dezembro de 2018 na Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre. A equipe de críticos é composta por Camilo de Lélis, Cristiano Goldschmidt, Débora Rodrigues, Marcelo Ádams, Pedro Delgado e Raquel Guerra, sob a coordenação de Renato Mendonça.
Todas as críticas podem ser lidas na página do evento: http://festecriticaccmq.blogspot.com/